Comunicação social no seu pior: Carlos Costa vai nú

O destaque das notícias dos últimos dias tem sido um comentário de António Costa sobre o governador relativamente à falta de competência do mesmo na liderança do Banco de Portugal. Estes comentários foram então severamente criticados por um exército de  comentadores, segundo os quais António Costa coloca em causa a independência, competência e coloca em causa a estabilidade do setor bancário. No entanto, precisamos de analisar cada um destes pontos.

A independência de Carlos Costa

Ora, vamos de imediato para a resolução do BES. Na conferência de imprensa onde é anunciada a resolução do BES, é focado o seguinte ponto:  “Não envolve, por isso, custos para os contribuintes”. Esta frase é repetida até à exaustão, quer por Carlos Costa, quer pelos membros do governo da época. Hoje sabemos que tal não corresponde à verdade, mas ainda hoje está presente nas FAQs do Banco de Portugal. Este é um tema que não diz respeito ao Banco de Portugal, mas sempre foi um cavalo de batalha da propaganda do governo.

Este alinhamento foi na realidade inaugurado três dias antes da data oficial da resolução do BES, no célebre concelho de ministros electrónico onde foi criada a legislação necessária para a resolução. Sabe-se também hoje, que a opção da resolução foi aceite, não porque seria aquela que garantia a solidez do setor bancário, mas porque seria aquela que teria menores custos para os contribuintes. Hoje sabe-se que nenhuma das duas é verdade, mas demonstra um total alinhamento político entre o governo da época e Carlos Costa.

O golpe de misericórdia na independência de Carlos Costa vem com a resolução do BANIF. Carlos Costa garantiu que a resolução do BANIF não foi feita antes das legislativas de 2015 de forma a não prejudicar os resultados eleitorais da coligação de direita, com um custo de mais de 2 mil milhões de euros para os contribuintes, e maior instabilidade para o setor financeiro.

No dia seguinte à resolução do BANIF, Carlos Costa deveria ter-se demitido.

A estabilidade do setor bancário

A resolução do BES foi um dos exemplos de instabilidade do setor bancário: a utilização do fundo de resolução retirou 4 mil milhões de euros de lucros dos bancos nacionais durante os anos mais próximos, e demonstrou sem sombra de dúvida a fragilidade do sistema bancário. Esta ação só por si colocou em causa todo o potencial de investimento no setor.

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O segundo prego foi a resolução do BANIF. Como pode ser possível é regulador ser enganado uma segunda vez. Depois do que aconteceu no BES, onde o Banco de Portugal repetidas vezes disse que tudo aconteceu porque foi enganado pelos administradores do banco, será que foram também enganados pela administração do BANIF? O que pode criar mais instabilidade no setor que uma segunda resolução, numa altura em que o estado já tinham injectado milhares de milhões ? Pode-se então concluir que Carlos Costa é o único responsável por toda a instabilidade no setor.

O último prego na estabilidade do setor foi a recapitalização do Novo Banco à custa de dívida sénior do BES. Se até à altura, apenas os investidores em ações e dívida subordinada tinham sido chamados a pagar a fatura, a inclusão dos investidores da dívida sénior de um banco para pagar a fatura da resolução deu uma machadada final a todo um setor, que viu colocar-se em causa todo o acesso aos mercados de capitais, agora que a dívida sénior já não se encontra protegida.

A (in)competência

Como definir Carlos Costa em termos de competência ? Alguns números:

  • Bancos alvo de resoluções: BES e BANIF. Se há primeira ainda poderíamos assumir o erro, apesar de tal não ser uma desculpa para um regulador.
  • (Des)Coordenação entre reguladores. Ao mesmo tempo que a coordenação entre Carlos Costa e o governo foi notória, foi também notória a total descoordenação entre o Banco de Portugal e a CMVM.
  • Informação aos mercados. Vamos regressar à história da resolução do BES:
    • 11 de Junho de 2014. O aumento de capital do BES é finalizado com sucesso. Este aumento de capital foi autorizado e apoiado pelo Banco de Portugal
    • 10 de Julho de 2014. Carlos Costa afirma  “A situação de solvabilidade do BES é sólida, tendo sido significativamente reforçada com o recente aumento de capital
    • 18 de Julho de 2014, 8 dias depois de afirmar que está sólido, Carlos Costa afirma pessoalmente “É muito provável que haja uma solução privada para o reforço de capital“. Como é possível que 8 dias depois de informar os mercados que o BES é sólido, dizer que precisa de um novo aumento de capital, apenas um mês depois de um outro aumento de capital.
    • 29 de Julho de 2014, o Banco de Portugal afirma: “No limite, se necessário, está disponível a linha de recapitalização pública criada no âmbito do Programa de Assistência Económica e Financeira, que poderá ser utilizada para suportar qualquer necessidade de capital de um banco português, no enquadramento legal relevante e em aplicação das regras de ajuda estatal. Em todo o caso, a solvência do BES e a segurança dos fundos confiados ao banco estão asseguradas”. Esta segurança durou 4 dias.
    • 1 de Agosto de 2014. CMVM suspende a negociação das ações do BES, não por ter sido notificada pelo Banco de Portugal de alguma informação relevante para o mercado, mas porque as acções estavam a descer 49% em 2 dias.
    • 3 de Agosto de 2014. É aplicada a medida de resolução ao BES.
    • Este é portanto uma história de informação errada que foi dada dos mercados, informação que não foi dada ao mercados e que resultou em perdas avultadas para os investidores que não tiveram acesso a informação privilegiada relativa aos dias imediatamente anteriores à data da resolução.
  • A provisão criada pelo Banco de Portugal para lidar com os pequenos investidores. Esta provisão ed 700 milhões de euros, que misteriosamente desapareceu debaixo das barbas do Banco de Portugal.
  • Finalmente, aquando da decisão do aumento de capital do Novo Banco usando dívida sénior do BES, ficou-se a saber que esta dívida estava a ser vendida a retalho nos balcões do Novo Banco!! Mais uma vez, onde estava o Banco de Portugal? Certamente a dormir enquanto era criava mais um conjunto de lesados do BES

No final de esta lista, fica então a pergunta: o que tem Carlos Costa para mostrar ao fim de 6 anos de mandato? Evitou a queda de algum banco? Melhorou a confiança na estabilidade do sistema financeiro? Resolveu os problemas criados pelas suas acções ??

No final do dia, só podemos concluir, não há nada nos últimos 6 anos em que possamos atestar a competência de Carlos Costa à frente do Banco de Portugal.

Carlos Costa vai nú

É por demais evidente. Não serão as palavras de António Costa que colocam em causa a independência do Banco de Portugal. Carlos Costa fez um excelente trabalho a garantir o alinhamento com o governo da altura, destruindo qualquer réstia de independência. Logo a seguir à independência, a estabilidade do sistema financeiro foi a vítima seguinte de Carlos Costa, que dos 6 anos de mandato, nada tem a mostrar.

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É algo que está então à vista: Carlos Costa vai nu. Já vai nu há vários anos, e apenas tem sobrevivido devido à proteção política do membros do governo ao qual deu guarida com o poder do Banco de Portugal. Carlos Costa falhou em todos os seus objectivos, nas suas regras e isenção, e tal é obvio até para os financeiramente iletrados. Está à vista de todos. Carlos Costa não tem qualquer condições para se manter no cargo. Já não o tinha quando terminou o mandato anterior, mas como foi visível, a sua dependência do governo a época exigia a sua manutenção.

Cada dia que Carlos Costa se mantém à frente do Banco de Portugal, é mais um dia perdido para o Banco de Portugal, e para todos os valores que dependem dele. Ter que vir o Primeiro Ministro vir a público dizer o que é obvio para todos, é um atestado de estupidez a muita gente, comentadores, políticos e mesmo ao ECB.